Divulgação científica no Brasil: desafios e avanços rumo à democratização do conhecimento
Global Convivial Forum
Melanie Metzen (Events and Outreach Coordinator)
Evento de Divulgação Científica da Fiocruz Brasília reuniu especialistas para debater políticas públicas, inclusão e estratégias para fortalecer a comunicação da ciência no país.
Entre os dias 13 e 15 de agosto de 2024, a Fiocruz Brasília promoveu a 2ª Semana de Divulgação Científica, reunindo pesquisadores, professores e comunicadores em um esforço coletivo para fortalecer a divulgação científica no Brasil. Pude participar do evento que teve como objetivos fomentar políticas públicas para a área e desenvolver estratégias para enfrentar desafios contemporâneos, como o negacionismo e a desinformação.
Uma das questões centrais do encontro foi a análise das iniciativas conduzidas por instituições como a Fiocruz, a Fapesp, o CNPq e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) nos últimos anos, bem como a construção de perspectivas futuras para a divulgação científica no país. Desde a pandemia de COVID-19, observa-se um crescimento no investimento e na visibilidade das iniciativas de comunicação da ciência. Entretanto, esse movimento enfrenta desafios estruturais e institucionais, que exigem soluções coordenadas.

Mesa de abertura 2ª Semana de Divulgação Científica. Imagem: Sérgio Velho
Graça Caldas, professora e pesquisadora do Labjor/Unicamp e Wagner Vasconcelos da assessoria de comunicação, Fiocruz Brasília. Imagem: Sérgio Velho
Diante de um cenário em que apenas 21% da população brasileira concluiu o ensino superior e menos de 1% possui pós-graduação, torna-se fundamental democratizar o acesso ao conhecimento. As instituições de pesquisa não apenas produzem conhecimento, mas também têm a responsabilidade de traduzi-lo e disseminá-lo para diferentes segmentos da sociedade. A popularização da ciência deve ser compreendida como parte essencial da missão acadêmica, promovendo a alfabetização científica e ampliando o diálogo com públicos diversos.
Na conferência de abertura, Juana Nunes, diretora de Popularização da Ciência, Tecnologia e Educação Científica da Sedes/MCTI, destacou a necessidade de estruturar políticas nacionais para a divulgação científica, a fim de coordenar e potencializar os investimentos na área. Um dos desafios apontados foi a fragmentação do sistema de ensino superior no Brasil, que conta com instituições federais, estaduais e privadas frequentemente operando de maneira isolada e competitiva, dificultando a integração de esforços.
A diversidade também emergiu como um elemento crucial na discussão sobre a comunicação da ciência. A ampliação do alcance da divulgação científica para populações em situação de vulnerabilidade social e econômica é um passo essencial para garantir inclusão étnico-racial e de identidade de gênero. Não basta tornar a produção acadêmica disponível; é preciso construir pontes eficazes entre o conhecimento e a sociedade, de forma a torná-lo acessível e relevante.

Um dos debates mais instigantes do evento ocorreu na mesa “Divulgação Científica em Tempos de Negacionismo”, com participação da pesquisadora Graça Caldas, do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor/Unicamp). Caldas ressaltou a necessidade de repensar modelos tradicionais de comunicação científica que dependem de intermediários, como jornalistas, editoras e revistas especializadas. Segundo a pesquisadora, uma das tendências observada nos últimos anos – o fortalecimento da presença digital de cientistas e instituições – pode ser um caminho para ampliar o alcance e garantir interação direta com o público, reduzindo a dispersão de informações.
Luis Amorim (Museu da Vida), durante sua participação da mesa “A ciência, a arte e o lúdico”, também destacou o fato de que a pesquisa sobre comunicação científica no Brasil ainda está em processo de consolidação e carece de um referencial teórico mais robusto. Embora existam programas de mestrado na área, como os oferecidos pelo LabJor/Unicamp e pela Fiocruz, ainda não há cursos de doutorado específicos em divulgação científica, o que limita a formação avançada de especialistas.
Outro desafio apontado foi a carência de metodologias mais robustas para avaliar o impacto das iniciativas de comunicação científica no Brasil. Essa lacuna metodológica reforça a necessidade de uma política estruturada e de maior investimento na área. No entanto, avanços já podem ser observados: atualmente, o CNPq exige a inclusão de um plano de comunicação como parte dos projetos de pesquisa financiados pela agência, um passo fundamental para integrar a divulgação científica ao processo de produção do conhecimento.
Ao refletirmos sobre o futuro da divulgação científica, torna-se evidente que sua consolidação depende de um esforço contínuo de fortalecimento institucional, capacitação de profissionais e construção de políticas públicas eficazes. Somente com uma abordagem estruturada e integrada será possível garantir que o conhecimento científico cumpra seu papel social e contribua para uma sociedade mais informada e participativa.
Diante desse cenário, as iniciativas de comunicação científica do Mecila ilustram a importância de estratégias contínuas e adaptáveis. Desde 2018, o centro tem investido em diferentes formatos de disseminação do conhecimento, passando por um processo de aprendizado constante e ajustes estratégicos. A aposta em tecnologias digitais, como podcasts, newsletters, um site multilíngue e comunicação ativa em redes sociais, tem permitido alcançar públicos diversos. Além disso, parcerias institucionais, como com o Conselho Latino Americano de Ciências Sociais (CLACSO), e a publicação de working papers em conjunto com o Instituto Iberoamericano de Berlim, reforçam o compromisso do centro com a democratização da ciência. Esses esforços demonstram como a comunicação científica pode ser aprimorada por meio da experimentação de formatos não tradicionais, contribuindo para aumentar o alcance e acessibilidade dos resultados de pesquisa.